O Homem do Castelo Alto | As diversas realidades de Philip K Dick
Continue LendoRoberto Honorato
Um clássico de Philip K Dick sobre realidades e distopias alternativas
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A relação do leitor brasileiro com a sua própria literatura não é das mais expressivas, ainda mais quando consideramos a ficção científica. Qual o caminho percorrido pelo gênero por aqui e como ele conversa com as influências anglo-saxônicas tão presentes em outras mídias?
Sem demora, Páginas do Futuro aceita a tarefa de apresentar, de maneira bem didática e em poucas páginas, a linha de eventos que pode ter provocado nosso cenário atual. Braulio Tavares ilustra em sua apresentação o que ele considera as três principais tradições literárias que contribuíram para o que conhecemos hoje como ficção científica. Começamos com grandes narrativas épicas e fantásticas, onde criaturas e jornadas inimagináveis (até então) são alguns dos elementos recorrentes. Em seguida, é através do casamento do fantástico com a “ascensão da literatura realista no velho continente” que nos deparamos com o chamado Scientific Romance, onde o extraordinário é tratado com um olhar mais pragmático. Para terminar, não é deixada de lado a importância de publicações pulp, principalmente a revista Amazing Stories, criada por Hugh Gernsback, que abrigou alguns nomes que logo seriam grandes autores do gênero.
Se a apresentação de Tavares já é o suficiente para instigar o leitor a conhecer mais sobre a ficção científica e sua posição no mercado editorial brasileiro, o mais impressionante ainda está por vir. Ele reúne aqui doze contos desenvolvidos em períodos diferentes, trazendo temas diversos, explorando subgêneros e compartilhando sua própria voz. É curioso ver como alguns autores desta coletânea tiveram contato com a ficção científica e escreveram usando alguns de seus componentes anos antes dela receber esse nome.
Reunindo autores como Raquel de Queiroz, Rubem Fonseca e Luiz Bras, Páginas do Futuro é em si uma máquina do tempo, nos fazendo viajar entre 1957 e 2010. Ainda que seja visível o impacto da literatura internacional em alguns dos contos, não há perda de identidade, como acontece em O Quarto Selo, de Rubem Fonseca, que carrega os traços de uma narrativa policial comum no que depois seria chamado de cyberpunk, mas também está acostumado com as ruas do Rio de Janeiro.
Há exemplos de contos que correm fora do Brasil, como Uma Breve História da Maquinidade, de Fábio Fernandes, onde se encontram vários elementos das ficções de vapor em uma Europa pós-Revolução Industrial — em outras palavras, o Steampunk.
“A FC brasileira não pode abrir mão de um conhecimento da FC internacional sob o risco de deixar de ser FC, e não pode abrir mão de um conhecimento equivalente da literatura do nosso país, sob o risco de deixar de ser brasileira”
Cada conto traz um comentário crítico, em algum nível, sobre o papel do homem e a maneira que lida com suas criações ou criaturas. Podemos ver em Veja seu Futuro, de Ataíde Tartari, ou Do Outro Lado da Janela, de André Carneiro, uma narrativa mais simples que depende do fascínio do protagonista com o objeto que carrega a trama. Estes contos poderiam facilmente figurar em alguma temporada de Além da Imaginação, como o próprio Braulio Tavares menciona em sua apresentação.
O livro tem a predominância de uma voz masculina, o que é esperado considerando o período dissertado pela obra. Não obstante, Raquel de Queiroz e Finisia Fideli marcam presença com suas histórias, que acabaram sendo algumas das melhores da antologia. Ainda que a ficção científica não seja o primeira coisa que vem em nossas cabeças quando pensamos em Raquel de Queiroz, o que a autora faz em Ma-Hôre é uma descrição intrigante com uma boa dose de ação, mas o que realmente se destaca é a proposta de nos colocar na pele do alienígena em contato com os humanos — essa é uma lógica narrativa atraente até hoje, então imagine a reação em 1961, quando o conto foi publicado originalmente.
Quanto a Finisia Fideli, seu Exercícios de Silêncio (provavelmente o meu favorito dos doze) conversa com o leitor de forma mais lenta, com atenção aos detalhes e a descrição sensorial dos personagens, com um enredo que lembra um pouco o estilo de Ursula K Le Guin, principalmente no excelente A Mão Esquerda da Escuridão. São histórias de introspecção e conexão com uma forma de coletivo, com protagonistas muitas vezes lidando com costumes do planeta no qual se encontra.
Páginas do Futuro é uma leitura rápida e bastante informativa sobre a história da ficção científica no Brasil. São doze contos que passam voando e você ainda tem as ilustrações de Romero Cavalcanti cobrindo algumas páginas com ótimas interpretações visuais do universo apresentado pelo livro.
Páginas do Futuro, de Braulio Tavares
Editora Casa da Palavra, 2011
160 Páginas
Ilustrações de Romero Cavalcanti
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Roberto Honorato
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