Mrs. Davis | Jesus vs Inteligência Artificial, Ciência vs Religião
Continue LendoDaniel Milano
Divertida, irreverente e inteligente, Mrs. Davis é uma pérola
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Leia mais sobre a quinta temporada de Black Mirror.
Para seu quinto ano, Black Mirror finalmente retorna ao formato original de três episódios, o que indica roteiros escritos com mais calma e atenção aos detalhes, principalmente porque todos são responsabilidade de Charlie Brooker, o criador da série. Smithereens é o segundo episódio desta nova temporada, um que se passa em grande parte no interior de um carro mas ao mesmo tempo atravessa o mundo para revelar uma narrativa sobre grandes corporações e a manipulação através das redes sociais.
Todos os dias Chris (Andrew Scott) para seu carro na frente de uma grande empresa de comunicação, a Smithereens. Usando um aplicativo de transporte, finalmente consegue ter alguém da empresa em seu carro, mas descobre que é apenas um estagiário. Ainda assim, Chris o amarra no banco de trás e aponta uma arma para sua cabeça. Enquanto a polícia tenta resolver o problema, o motorista tem apenas uma demanda: conseguir entrar em contato com Billy Bauer (Topher Grace), o grande visionário responsável por uma das maiores redes sociais do mundo.
O episódio é dirigido por James Hawes, o mesmo de Hated in The Nation, outro onde a rede social é essencial para a trama. O que ele tenta aqui é construir uma atmosfera de tensão do início ao fim, o que ele consegue através de um bom ritmo, alternando entre as sequências no interior do carro com todo o alvoroço causado pelo protagonista. E se não fosse por conta de Andrew Scott, esse episódio poderia ser um desastre. Scott tem a responsabilidade de carregar a trama e tentar entregar cada linha de diálogo com convicção, o que foi uma tarefa árdua por conta de algumas partes do roteiro onde fica visível a necessidade de confrontar as questões morais do episódio.
Scott usa tudo que aprendeu em Sherlock, interpretando o excelente Moriarty, para apresentar um personagem que pode explodir a qualquer momento. Seu comportamento beira o exagero, mas o ator é bom o suficiente para evitar que o episódio caia em um território mais cômico. Isso também acontece com Topher Grace, que experimenta uma versão mais caricata de um presidente de alguma grande companhia de tecnologia, lembrando um pouco um dos criadores do Twitter, Jack Dorsey, com seu discurso calmo e comportamento descontraído. Todo o desenrolar da trama que resulta na revelação do retiro de silêncio é uma grande piada com Dorsey.
Além de Scott e Grace, temos Damson Idris como Jaden, o pobre estagiário refém. Idris também esteve este ano no episódio Replay, do revival de Além da Imaginação. Aos poucos ele constrói um currículo com atuações sólidas e estou interessado no que ele pode fazer no futuro.
O terceiro ato caminha para o clássico “não use o celular no volante”, o que acabou sendo uma revelação menos impactante do que o esperado, considerando a habilidade da série em entregar reviravoltas que fazem o público debater até hoje, e como a presença de Billy Bauer parecia tremendamente importante para a confissão catártica de Chris. Por conta de uma execução afetada por um roteiro mais contido, Smithereens pode perder um pouco do seu charme ao ser assistido uma segunda vez, mas você acaba ficando mesmo por conta das performances e toda a construção da tensão até aquele ponto.
Não sei quanto às intenções do episódio em referenciar os trabalhos de David Fincher, mas ficou difícil não imaginar todo o clímax do filme Seven quando a câmera escolhe um plano aberto e revela o local onde o carro de Chris foi parar, no meio do mato perto de vários postes de energia e a polícia cercando o incidente. Também há uma estrutura narrativa que lembra Zodíaco, mas isso está ligado exclusivamente ao jeito que o roteiro mostra os vários obstáculos para fazer com que uma simples mensagem seja recebida. Aqui temos uma trama envolvendo o criador de uma rede social que conecta milhões, mas é uma das pessoas mais difíceis de se encontrar no mundo.
Smithereens pode não se aproveitar muito bem do formato da série, deixando de lado toda a premissa que envolve a ameaça da tecnologia, mas ainda assim tem seus méritos, como as ótimas atuações e a experiência de angústia durante todo o processo.
Ficha Técnica:
Black Mirror, S05E02
Criada por Charlie Brooker
Direção de James Hawes
Roteiro de Charlie Brooker
Daniel Milano
Divertida, irreverente e inteligente, Mrs. Davis é uma pérola
Roberto Honorato
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