Mrs. Davis | Jesus vs Inteligência Artificial, Ciência vs Religião
Continue LendoDaniel Milano
Divertida, irreverente e inteligente, Mrs. Davis é uma pérola
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Em The Old Man and The Seat, segundo episódio da quarta temporada de Rick and Morty, temos duas linhas narrativas aparentemente distintas, mas mais uma vez unidas pelo tema principal do episódio, e esse tenta ser o mais claro possível com o conceito abstrato mais complexo de todos: amor.
Rick tem um estagiário chamado Glootie, dublado por Taika Waititi (What We Do In The Shadows). Ele tem tanta vontade de criar um aplicativo com alguém que Rick precisa tatuar um aviso na testa de Glootie para que ninguém aceite seu convite. Mas é óbvio que Jerry fica com pena do estagiário e aceita desenvolver um aplicativo de relacionamento chamado LoveFinderrz, capaz de conectar a pessoa que melhor combinar com você. Enquanto isso, Rick, que considera uma pessoa envergonhada na hora de “fazer o número dois”, vai a outro planeta para desfrutar do silêncio e conforto de seu próprio banheiro ao ar livre, uma privada em um bosque colorido, mas descobre que alguém esteve ali usando seu trono, isso faz com que ele saia em uma caçada para acabar com o responsável por invadir seu espaço.
Enquanto a trama envolvendo LoveFinderrz é uma clara piada com as várias ferramentas de relacionamento que você encontra em qualquer loja virtual, como Tinder (uma das ideias originais de Jerry era chamar o aplicativo de CUPIDR), a de Rick e sua privada é mais um momento importante para o desenvolvimento do personagem, que culmina em uma das cenas mais depressivas da série, mesmo que esse tenha sido um episódio bem positivo em um aspecto, a interpretação do conceito de amor.
Se em temporadas passadas Rick and Morty considerou o amor apenas uma “reação química que permite o acasalamento humano”, em The Old Man and The Seat recebemos uma mensagem contrária, e é onde as duas tramas convergem, mostrando como é impossível conviver com alguém apenas por conta de gostos similares ou pequenas afinidades, e o verdadeiro amor se constrói através de tentativa e erro, e temos isso nos personagens de Jerry e Beth, que mesmo tendo se divorciado na temporada anterior, acharam um jeito de se amar – por enquanto.
Mas não é apenas de relacionamentos amorosos que estamos falando, mas de amizade também. Quando Rick encontra o violador de sua privada, Tony, dublado por Jeffrey Wright (Westworld), também descobre que o homem não se importa com a possibilidade de ser assassinado por Rick, isso porque ele perdeu sua esposa e agora não encontra significado na vida.
Durante a primeira conversa dos dois, Tony diz: “Sabe o que alguém quer dizer quando precisa defecar discretamente? É uma desculpa para mostrar quem está no controle. Você quer tomar conta da única parte da vida que considera ser sua e quer proteger de um universo que pega tudo o que quer. Pegou a minha esposa, e claramente pegou algo seu”. Isso atinge Rick com tanta força que os dois começam uma bizarra relação onde a privada de Rick continua sendo violada, e ele chega a se vingar colocando Tony em uma simulação na qual se reencontra com sua mulher em um paraíso repleto de vasos sanitários. Descobrimos que Rick não teve coragem de matá-lo, então Tony faz um convite de amizade, que não é aceito.
Rick continua planejando maneiras de se vingar de Tony, mas quando vai visitá-lo no trabalho para entregar chocolates com -algum tipo de- laxante, recebe a notícia de que ele morreu enquanto tentava viver a vida ao máximo esquiando. Rick fica sem reação e volta para sua privada, onde instalou uma mensagem holográfica como pegadinha para quando Tony fosse invadir seu espaço novamente, assim ele senta em seu trono, deprimido, enquanto assiste a si mesmo dizendo o quão patético e solitário é.
Sabemos que Rick perdeu alguém no passado (provavelmente um Morty, o que é indicado no episódio Get Schwifty, da segunda temporada), então seguiu a mesma visão anarquista sobre o universo que Tony aceita depois da morte de sua esposa. A relação dos dois homens existe por conta de suas perdas traumáticas, são visões parecidas de mundo e realidade, o que nesse caso, ao contrário dos aplicativos de namoro, podem criar uma forma amizade. É uma coisa complexa demais para alguém como eu, que não tenho uma bagagem filosófica expressiva, mas podemos ver como os temas do episódio parecem indicar uma mudança na abordagem da série, um pouco menos niilista, comentando sobre seu próprio papel entre outras séries que exploram questionamentos similares.
É engraçado ver o contraste entre a humanidade e a raça do estagiário Glootie, comandada pelo líder e a rainha Monogatron (a piada sobre monogamia está pronta já no nome), que parecem ser bem ajustados e avançados em departamentos que envolvem relacionamento, tendo como principal ambição a conquista da água de nosso planeta, mas é claro que nem eles tem um casamento perfeito.
“Como uma civilização pré-aplicativo, o valor do seu amor é definido pela escassez. Vocês são altamente treinados para procurá-lo, e vocês não têm ideia alguma de como mantê-lo. Se tivessem se dedicado a compreender o amor, teriam aprendido que é tão abundante quanto água. Mas sabe o que não é abundante? Água. Essa porcaria acaba”.
Agora, para algumas referências:
O que achou do episódio?
Parece que as coisas estão seguindo um rumo positivo até demais, o que pode indicar que as coisas vão ficar bem ruim. Vamos ver.
Daniel Milano
Divertida, irreverente e inteligente, Mrs. Davis é uma pérola
Roberto Honorato
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